Músicas, Seriedades, Burridades e Coisas Ogonorantes.

Um blog para quem não tem nada para fazer. Para pessoas que vieram do nada e hoje não tem porra nenhuma.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

O galo da Titia.

Essa história é longa, aconteceu no início dos anos 70, e lembro com toda certeza que dela participaram: eu, Tonho e Paulo Góes meus primos, Rui Cabeça, Jó (um carioca presepeiro primo do Rui), e o Ivan. Tenho dúvidas quanto à presença do: Joel Macambira, Guta Amorim e Oswaldo Garcia. Bom, independente dessa incerteza vamos à história.

Todo final de semana (sexta a domingo) nossa turma se reunia sagradamente para uma farra, bebíamos toda a espécie de bebidas: cerveja de primeira e de última categoria, uísque dos bons e dos maus, gim, rum, vodka, cachaça, batida, vinho (especialmente de garrafão e Vinho Nobre, este último feito com cachaça e Ki-Suco de uvita), sidra cereser, licores dos mais variados e avariados, em suma tudo que deixasse o nego alegre, cambaleante, e porre mesmo.
Só para ilustrar essa idolatria por bebida, lembro de uma vez no Mosqueiro, final de férias, na casa do velho Macedo (pai da minha amiga Ibi), tomamos pelo menos uns 5 litros de batida de pasta de dentes Kolynos, passamos uns 3 meses vomitando só de escovar os dentes ao acordar. A asia então, nem me falem, só de lembrar tenho vontade de chamar a morte.
O final de nossas farras geralmente terminava na casa do Tonho, onde quase sempre encontrávamos um chouriço marajoara que rendia uma farofa espetacular. Contudo, teve um final de uma farra onde encontramos a geladeira do Tonho sem o nosso querido chouriço, julgo que a Titia precavida com nossos assaltos a sua geladeira, deva ter levado tudo para o Mosqueiro. Já estávamos conformado em beber o resto da bebida que tínhamos a seco, e dormir com fome, quando o galo de estimação da Titia dá sinais de vida, ao cantar pela primeira vez na madrugada (tipo 3 horas de madruga). Esse ato foi fatal para o animal, pois o gênio maligno do Rui Cabeça despertou e sugeriu que traçássemos o galo com arroz.
Aí começou a verdadeira batalha. Primeiro tínhamos que pegar o galo no escuro e no quintal da Titia que era cumprido e de extensão razoável, tipo uns 10 metros. Havia no quintal poucas árvores o que poderia facilitar nossa tarefa, todavia tinha alguns pés de bananeira que podiam facilitar a vida do galo. Reunimos e montamos uma estratégia para pegar o galo. Fizemos uma corrente humana, tipo uma barreira de futebol, de um lado a outro do quintal, a idéia era marchamos por toda a extensão do terreno e acuarmos o galo no fim do quintal, onde estava o muro limite. Além disso, tivemos a precaução de escalarmos o Jó, primo do Rui e que segundo ele próprio tinha sido goleiro juvenil do Flamengo, para se postar atrás da barreira, caso o galo conseguisse furar o cerco, ele como um bom goleiro saltaria para pegar o galo, plano pronto colocamos em prática. Acho que fizemos umas 30 tentativas e o diabo do galo sempre furava o cerco, o Jó coitado estava todo estropiado de tanto saltar sobre bananeiras, é que toda vez que passávamos pelas bananeiras, as folhas mexiam, e o reflexo do Jó era instantâneo, o homem pulava sobre o bananal. Travamos essa batalha por cerca de 2 horas, e com o dia clareando não teve jeito o galo foi capturado.
Aí começa outra guerra, matar de fato o galo. Primeiro fomos alertados pelos mais experientes que deveríamos dar cachaça pro galo, para amolecer a carne e permitir a matança sem muitas dores pro bichinho. A contragosto de todos, tivemos que ceder algumas doses de nossa cachaça para o galo, que era alcoólatra, pois bebeu umas 15 doses, e não ficava porre. Inclusive depois de ter tomado umas 5 doses, o galo se encostou na parede com uma pose de gangster e disse: - “Porra já que eu vou morrer, deixa eu beber com prazer”. Abriu o bico e ficou sorvendo outras 10 doses, quase acaba com nossa birita. Em seguida o galo desbundou de porre, e o momento fatal chegou.
Escalamos inicialmente o Paulo Góes para matar o galo, o primo disse que tinha prática. Depois de uns 20 minutos o Paulo Góes entra chorando copiosamente na sala onde bebíamos e disse que não tinha coragem de matar o galo. Em seguida fui nomeado carrasco, peguei a faca depenei um pouco o pescoço da ave e tentei cortar o mesmo, não sei se estava com pena ou medo de sangue, só sei que também não consegui fazer sequer um golpe no galo. O Tonho e o Jó resolveram declinar do convite de carrasco, restou o Rui Cabeça, que também tentou e alegou que a faca estava desamolada. Como ninguém conseguiu matar o galo na forma tradicional, lá vem de novo o Rui com sugestões cavernosas. Propôs que matássemos o galo com uma trancada na base do crânio. Pegamos uma tranca enorme que ficava na porta da cozinha e partimos na direção do galo, que já estava ficando bom do porre, e pedia mais uma dose. O pescoço da ave pendia para um lado e para o outro, o que dificultava que acertássemos as trancadas na moleira do animal. Acho que pegou umas duas porradas, porém nada que machucasse o galo de forma letal. Tentamos o método da tranca umas 10 vezes e todas falharam.
Olhamos para o Rui e ele sugeriu a morte tipo molinete (método novo inventado pelo Rui, tipo um torniquete), ou seja, deitamos o galo com o pescoço rente ao chão, colocamos sobre o pescoço um cabo de vassoura, e eu pisei de um lado e Paulo Góes do outro.
Aí o Rui pegou a bunda do galo e começou a rodar, o pescoço do galo foi ficando tipo uma rosca de parafuso, o galo foi ficando asfixiado e morreu, porém o movimento de rodar a bunda do galo continuou até que corpo se separasse da cabeça. Matamos o galo, isso por volta de 7 horas da manhã, agora os finalmente culinário iria para quem declarou que entendia do riscado, o Jó e o Tonho. O Jó foi designado para fazer a assepsia do bicho, retirando as penas, etc. Voltamos a beber e deixamos o Jó nessa tarefa. Passados uns 15 minutos o Jó me vem da cozinha chorando, com o corpo todo ensangüentado, tomamos até um susto: - O que foi isso cara?
Diz o Jó: “Meus amigos estou com pena desse bichinho, toda vez que puxo as penas dele jorra sangue para tudo que é lado.”
Não sabíamos que para retirar as penas deveríamos colocar o bicho na água quente. Sem saber o que fazer, lembramos que o melhor cozinheiro da turma era o Ivan, que não estava presente na farra. Ligamos pra ele e pedimos que ele viesse até a casa do Tonho para preparar o galo. Ele disse que iria, mas pediu que colocássemos o galo na água quente, para retirarmos as penas e que o restante ficaria com ele. Bom, colocamos o galo na água quente e voltamos para beber. Ocorre que todos nós estávamos exausto, com sono da porra, acabamos dormindo. Cerca de 2 horas depois lembro o Ivan dando porradas na porta, acordamos com uma fumaceira danada na casa toda. A água secara no fogão e o galo estava sendo tostado literalmente com pena e tudo. Abrimos a porta para dissipar a fumaça, o Ivan entra e corre para a cozinha, depois de alguns minutos vem e dá o veredicto, o galo queimou, não podemos fazer mais nada. Antes que fossemos embora com fome, o Tonho pede que eliminássemos todo tipo de vestígio e/ou rastro do assassinato do galo, que era muito querido pela Titia. Limpamos o quintal, cozinha e pegamos o galo que estava tipo um eletrocutado, colocamos em um saco e descartamos o saco na lixeira da A.C. Simões que ficava em frente da casa do Tonho. Na segunda feira a Titia chega do Mosqueiro, e depois de vistoriar a casa chama o Tonho e pergunta: - Quem matou meu galo?
- Que galo mamãe?
- O meu galo, a cabeça dele está na pia da cozinha! (Havíamos esquecido.)
Não teve jeito, ele teve que confessar. Depois disso tivemos que mudar o roteiro do final de nossas farras.

3 comentários:

  1. Apesar da imperdoável omissão sobre a minha efetiva presença (viva e sóbria) naquele lamentável cenário de operações, até para que se otimizem eventuais fluxos de meias verdades às gerações futuras, sinto-me na obrigação de esclarecer que o presente episódio não se esgotou com aquela cruel, sádica e lenta execução do garboso galináceo.
    Já na fase do inquérito, instaurado para apurar as responsabilidades sobre o violento espetáculo de sangue pela SPBE (Sociedade Protetora dos Bípedes Emplumados) em conjunto com a Aeronáutica - já que a vítima guardava estreitos laços afetivos com um de seus mais briosos oficiais, frequentador assíduo do local do assassinato - a verdade finalmente emergiu.
    Muito mais do que a fome de ressaca, simplória e serenamente confessada pelos acusados, o crime na realidade foi motivado por um mesquinho e absurdo sentimento de vingança, sinalizada de forma irracionalmente corporativa, contra um folclórico e conhecido leão-de-chácara conhecido como "Galo Teso", que os havia posto para fora do puteiro onde trabalhava, por estarem os réus, à guisa de "dançar solto", apalpando acintosamente as partes íntimas das animadas frequentadoras daquele festivo salão de bailes sem qualquer acordo de contrapartida financeira.

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  2. O Bob Freitas escreveu dizendo que estava presente nessa matança. Julgamos até que sim, mas não concordamos com o estado de sóbrio, pois com toda certeza não tinha nenhum que não estivesse bêbado, inclusive o galo. E caso tivesse algum sóbrio na parada, teríamos saboreado o galo, ao invés de dormirmos coçados.

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  3. Como ninguém pode se conciderar imune aos efeitos (algumas vezes até bastante conveniente) da amnésia pós alcoólica, notadamente quando combinada à ausência ou precariedade das ações de manutenção preventiva nos "processadores" operantes da memória de longa duração, sinto-me forçado a aquiescer a dúvida sobre o meu efetivo estado de consciência naquele infausto momento.
    Por isso mesmo é que o nosso saudoso tio Mariano, o "Macedão", do alto de sua invejável sabedoria - sempre estratégica e confortávelmente instalado no avarandado do seu Retiro Ibi, na praia do Ariramba - utilizava sacanicamente o verbo "morrer" para designar os imprevisíveis efeitos decorrentes da metabilização alcoólica no frágil e despreparado organismo dos beberrões amadores.

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