As crenças culturais reinaram durante boa parte de minha infância e juventude. Minha Tia Eunice, que me criou, regulava nossos hábitos com essas crenças e medos.
Tomar açaí com maracujá Deus me livre. Com leite nem pensar. E com manga, havia até exemplo de que fulano de tal tomou açaí pouco tempo depois chupou uma manga e pá pum, caiu estatelado.
Acabou de tomar um cafezinho nem pense em sair se estiver chovendo. Almoçou e foi tomar banho, pode ligar para o Armador Duarte. E pegar em tesoura na hora da chuva, ficava estorricado com o raio na cabeça.
Para desobedecer a essas crenças, lembro-me de recorrer a minha vó Mimíca, que sempre dizia: pode comer, pode fazer, pois uma coisa nada tem a ver com a outra. Certamente minha avó se valia de seus conhecimentos advindos dos ensinamentos de meu avô, que teve formação em várias ciências.
Com a vó Mimíca do lado experimentávamos várias dessas associações mortais. Mas perto da Tia Eunice, ninguém se atrevia, ela só olhava pra gente, e sussurrava em voz baixa, lembra do Seu Aristeu, morreu fazendo isso. Corríamos para pia, lavávamos a boca e passávamos o dia cuspindo para expelir a mistura letal.
Meu Pai, como era de se esperar, herdou da mãe (Mimíca) essa sabedoria, e por várias ocasiões reduziu a pó as crenças da Tia Eunice.
Mas teve uma passagem nas nossas vidas, onde meu Pai se valeu das crenças culturais da Tia Eunice.
O Mauro meu irmão menor, que o Papai curtia de montão, era gordinho, afoito, um cara engraçado, pois vivia dizendo besteiras e fazendo artes, com resultados tragicômicos.
Pois bem, o Mauro num dia chega próximo ao Papai e diz:
- Pai, ando muito nervoso.
Era de se esperar que estivesse nervoso, pois na ocasião havia ocorrido uma explosão provocada por um tubo de spray, na queima do lixo que uma empresa de engenharia fazia em seu terreno, vizinho a nossa casa.
O Papai olhou pro Mauro e disse.
- Mauro, isso é besteira fácil de curar. Vai na geladeira e prepara 3 fatias grossas de queijo cuia e 4 fatias finas de goiabada cascão. E de 15 em 15 minutos come uma fatia de queijo e outra de goiabada. Na última ida a geladeira come 1 de queijo e 2 de goiabada. Vais ficar sem um pingo de nervoso.
O Mauro seguiu a risca o receituário, e depois de 3 idas a geladeira, exatos 45 minutos depois vai até o Papai e diz.
- Pai estou muito calmo, quase dormindo... (também pudera comeu quase todo o queijo cuia, metade da goiabada e vários pães).
Papai sorriu e olhou para a mamãe Ciloca e disse.
- Essa Eunice me ensina cada coisa infalível.
P.S. - Gostaria de dizer que éramos 6 irmãos e o queijo cuia e a goiabada cascão eram controlados pela minha mãe Ciloca, que em determinados lanches e/ou sobremesas nos brindava com 1 única fatia de cada. Mas se o Conduruzão mandasse, não tinha Ciloca que desse jeito. E ele querendo ajudar o Mauro a matar seus desejos, vem e me inventa essa crença Euniciana.
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